Sunday, December 09, 2007

Meu (quase) primeiro beijo

Fui acordada no meio da noite por uma menina magricela que nunca gostou de mim. Ela era de um grupo de meninas meio aloiradas que dançava axé. Eu nunca me interessei por axé. Então ficava com o grupo das meninas menos aloiradas e de óculos, que na realidade, só falavam mal das outras porque queriam dançar axé.
Era umas 3 da manhã e eu estava no acampamento. Uma das coisas que se fazia nesse acampamento era cuidar da bandeira, que ficava no centro do sítio, num mastro. Então fazíamos turnos de duas em duas horas de madrugada pra ficar acordado em sentinela. Nesse dia, tinha de ficar de sentinela com o ELE.
ELE era um menino magrinho e mais alto que as crianças normais. Não jogava bola, adorava video-game e uma música do Maurício Manieri que eu já não lembro mais. Tinha opiniões fortes e normalmente saía na mão com os outros meninos e apanhava. No começo todo mundo achava que ele era gay, mas eu tinha certeza que era só delicado. Era completamente apaixonada por ele desde os 10 anos e meio, ou seja, desde o acampamento retrasado. Minha melhor amiga era apaixonada pelo melhor amigo dele. Saímos algumas vezes para ir ao cinema, os quatro, e todas as vezes ficamos com os pézinhos balançando na cadeira esperando o momento do tal primeiro beijo, que nunca chegou. Ficamos desoladas uma porção de vezes e colocamos sutiãs com bojo uma outras, associados a umas tic tacs coloridas nos cabelos e um gloss de glitter.
Naquela noite de julho, eu devia estar com um charme muito especial no meu auge dos 11 anos: cabelos enrolados, encapotada com casacos e cachecóis, cara de sono e gosto de quem acabou de acordar.
Fomos andando então até a bandeira. Eu, olhando para o chão com as mãos no bolso e ele, expansivo, chutando pedrinhas, falando alto e tentando um contato físico. Conversávamos sobre algo que o lapso de tempo não me permite acessar... Não imagino sobre o que podíamos conversar nos meus 11 e nos 13 anos de idade dele.
Chegamos lá e ficamos em silêncio. Eis que chegam minha-melhor-amiga e o melhor-amigo-dele, saindo de um canto qualquer. Os meninos trocam sorrisos suspeitos, se cumprimentam. ELE diz:

- Vamos dar uma volta, eles cuidam da bandeira pra gente.

Eu tinha medo de escuro, mas ele tinha uma lanterna e o lugar era razoavelmente claro. Subimos umas mini-colinas, eu quase caí, ele me segurou, chegamos a um campo aberto, atrás de um galpão, onde os meninos costumavam jogar bola. Sentamos. Sem a menor pressa, ele pega na minha mão e dá um sorriso, que obviamente me constrangeu e me obrigou a olhar pro lado. Ele põe a mão no meu rosto e vai chegando perto, quando eu o interrompo:

- Porque eles estavam acordados?
- Eles quem? - ele retruca quase suspirando de impaciência.
- Eles..
- Eles deviam estar ficando, né, sei lá. O que importa é que eles estão cuidando da bandeira pra gente, né?

Cuidando da bandeira pra gente! Era isso! Naquele momento tudo ficou claro na minha mente! Os dois tinham arquitetado tudo para que ele pudesse me beijar. Fiquei chocada! Como ele pudera! Me usou, como um objeto!

- Vamos descer, temos que cuidar da bandeira - disse segura e levantando.

Andei uns passos à frente. Tivemos de fitar o silêncio que se instalou por aquela uma hora e meia seguinte. Nunca mais nos falamos nos acampamentos, embora os dois sofressem terrivelmente em silêncio e talvez escrevessemos milhões de vezes em papéis os nomes um do outro por extenso, ao som de "I don't care who you are... Where you're from... Don't care what you did.. as loong aas you looove me".

Encontrei com ele um dia desses que me perguntou:

- E aí? Fazendo o que da vida?
- Nada - eu disse
- Nada de nada?
- Na verdade, tudo.
- Tudo e nada?
- Tudo e nada, ao mesmo tempo.

Saturday, December 01, 2007

Acordei descansada depois de um longo período , que já nem sei bem onde começou, de noites mal dormidas.
E me deu vontade de ler Ana Cristina César pra ver se meus atos repetidos fazem algum sentido na ciranda do mundo sem-sentido - ela sabe significar o insignificável em meio ao caos como ninguém.
Ás vezes me esqueço que sou só um sintoma, um sintoma histórico. Meu mundo sem sentido é o mesmo que de todos os outros personagens. Minha dor é organizada, meu prazer é medido. Eu sou (e você também) clichê.

E isso me acalma M-U-I-T-O.
Porque a gente gasta muita energia pra fingir que nada ocorre. Muito mais do que se a gente simplesmente se jogasse, se jogasse mesmo, sem dó, nessa afirmação do não-sentido. (que não é a negação do sentido, pois ele não existe.)

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Andávamos discutindo algumas questões sobre o invislumbrável e acho que no final das contas, só nos resta essa busca mesmo. (Tem certas buscas que valem a pena mesmo sabendo que não há nada pra encontrar.. O trajeto é o que mantém o céu no lugar, as batidas de coração em harmonia e os saltos suicidas em seu curso normal. O mundo só funciona assim e.. ainda bem)

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Sei lá porque ainda mantenho esse blog.
Acho que gosto.
é isso.
Acho que gosto..!